O acesso à internet é um direito humano fundamental? Ou um privilégio que acarreta a responsabilidade por um bom comportamento? É essa a questão que precisará ser resolvida pelas autoridades de diversos países, que tentam prover acesso em massa à web e ao mesmo tempo impedir a cópia ilegal de música, filmes e videogames em formato digital.
O Congresso dos Estados Unidos realizou audiências na semana passada quanto ao crescente problema da pirataria que, segundo o setor norte-americano de entretenimento, vem causando perda de receita anual da ordem de US$ 20 bilhões. Mas se os acontecimentos em Paris na semana passada servem como indicação, soluções legislativas não serão fáceis.
Os legisladores franceses rejeitaram um plano de combate à pirataria defendido pelo presidente Nicolas Sarkozy. O projeto de lei dispunha que as conexões de internet dos usuários que ignorassem advertências repetidas sobre o uso de serviços não-autorizados de troca de arquivos seriam cortadas.
Sarkozy declarou que planeja reapresentar o projeto de lei, mas a opinião pública se opõe solidamente à idéia de cortar o acesso dos usuários de internet, e muitos políticos não apenas na França, mas em toda a Europa e em outras regiões -, parecem estar prestando atenção a essa tendência. No mês passado, o Parlamento Europeu tomou medidas preventivas ao aprovar uma resolução não-compulsória que definia o acesso à internet como liberdade fundamental que não poderia ser restrita a não ser por via judicial.
A Nova Zelândia recentemente suspendeu uma lei sob a qual os provedores de acesso à internet seriam forçados a reprimir as cópias ilícitas. E, no Reino Unido, anos de discussão entre os proprietários de conteúdo, provedores de acesso e o governo não chegaram a um plano capaz de conter a pirataria. "Existe uma crescente compreensão de que o acesso em banda larga é fundamental para a participação econômica e social", disse Sacha Wunsch-Vincent, economista da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e estudioso da tecnologia da informação.
"Há quem imagine se isso é compatível com cortes compulsórios de conexões de Internet". Os proprietários de conteúdo ocasionalmente se saem melhor nos tribunais, junto aos quais obtiveram diversas decisões contra entidades acusadas de pirataria. Eles esperam nova decisão favorável esta semana, quando a linha de frente da guerra contra a pirataria será um tribunal da Suécia.
Na sexta-feira, um juiz de Estocolmo deve decidir se quatro pessoas conectadas ao popular serviço de troca de arquivos Pirate Bay são culpadas de violações criminais da lei de direitos autorais. Caso sejam, podem ser sentenciadas a até dois anos de prisão. Mas os dois lados indicaram que apelariam em caso de decisão adversa, e o Pirate Bay anunciou que, de qualquer jeito, continuaria a operar de outro país, caso derrotado. Enquanto isso, novas maneiras de trocar conteúdo protegido por direitos autorais estão ganhando popularidade na internet.
Enquanto os legisladores franceses se preparavam para votar a proposta de Sarkozy, o Pirate Bay começava a oferecer um novo serviço cujo objetivo é bloquear a medida e outros esforços de reprimir os sites de troca de arquivos. Por cinco euros ao mês, o site forneceria ao usuário tecnologia capaz de ocultar seu endereço de computador. O sistema foi desenvolvido para contornar uma nova lei sueca que torna mais fácil para as autoridades obter, com aprovação judicial, os endereços de internet dos supostos fraudadores de direitos autorais. Desde que a lei entrou em vigor, o tráfego de internet no país caiu em mais de um terço, o que sugere queda na troca ilegal de arquivos, a qual, de acordo com algumas estimativas, responde por até metade do tráfego total na web. David Price, diretor de informações sobre pirataria da Envisional - empresa de Cambridge, na Inglaterra, que ajuda estúdios de cinema e outros clientes a fiscalizar violações de direitos autorais na web -, disse que embora as trocas de arquivos pareçam estar parando de crescer em todo o mundo, sites que oferecem alternativas aos downloads, como transmissões piratas de filmes em modo stream, estão crescendo rapidamente. Tim Kuik, diretor da Brein, uma organização holandesa de combate à pirataria, diz que existe um paradoxo na maneira pela qual o público vê os direitos autorais na internet e fora dela. "Se você colocasse 200 gravadores de vídeos em sua garagem e começasse a vender cópias de filmes, a polícia não demoraria a aparecer", diz. "Mas se alguém faz a mesma coisa na web, todo mundo sai alegando liberdade de informação".
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